A vida de Renato, contada quase diariamente por seu biógrafo favorito

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Hiatus (01/01/2016)

A quem leu até aqui, agradeço de coração. Quando um hobby vira obrigação, perde-se seu sentido. E foi isso o que aconteceu. Não vou excluir nada, mas não prometo retomar tão cedo. Feliz ano novo!

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Amnésia (01/12/2015)

Assim que saiu de casa, como é de costume, Renato olhou no relógio e notou que estava mais de 20 minutos atrasado em relação ao horário regular cotidiano. Refletiu e não notou como conseguiu se atrasar tanto, mas também não se preocupou muito com o fato e partiu de ônibus para o escritório.

Uma vez no trabalho, não teve grandes problemas para fazer em paz o que precisava. Mateus estava mergulhado em outros assuntos e preso a uma sala de reunião. Laura foi para o escritório do interior e não o chamou no comunicador interno da empresa. Até Andressa demorou para aparecer nesse comunicador na manhã, ao contrário do que costuma fazer assim que o rapaz chegar. Aproveitando-se dessa calma, Renato resolveu ajustar seu planejamento orçamentário para o fim de ano, incluindo gastos com o décimo terceiro salário e ajustes em suas poupanças.

No almoço, foi sozinho a um restaurante japonês ouvindo um podcast de economia e política para distrair a cabeça. Alimentou-se bem, incluindo um pequeno pote de sorvete Ben & Jerry's de chocolate. Voltou concentrado para o segundo round e manteve o ritmo desacelerado, mas contínuo, de produtividade.

Se não fosse o horário de verão, o sol estaria se pondo quando Renato chamou Alice por mensagem de celular para combinarem o fim do dia. No domingo à noite, depois de assistirem "O Grande Truque" de Christopher Nolan e vendo o interesse da namorada em filmes com plot twists interessantes, ele recomendou a ela o filme "Amnésia", do mesmo diretor. Pré-acertaram assistirem nesta terça à noite e estava sendo checada a aderência da moça à ideia.

Conforme ela citou, terça-feira é dia do rodízio do seu carro, o que implica que o veículo só poderá sair da garagem pouco antes das oito na noite. Com os cronogramas sincronizados levando em conta esse detalhes, Renato estendeu o expediente um pouco mais, aproveitando a sensação de utilidade que sentia naquele momento, e encontrou-se com Alice na frente de sua casa pouco antes das nove.

Juntos, tomaram um "café-da-noite" e conversaram um pouco. Ela contou que uma amiga sua casada estava brigada com o marido por questões típicas de relacionamentos matrimoniais (dinheiro, presença em casa, cuidado com a filha pequena...) e deu alguns pitacos, pelo que ele se sentiu a vontade para fazer o mesmo. Cabe ressaltar uma frase que ela disse e o colocou reflexivo:

- Li uma vez uma psicóloga que disse que, em 50 anos, todos os paradigmas de família que vemos hoje terão caído. Não haverá mais casamento como vemos hoje, morar junto para sempre, monogamia estável, etc. Quero estar morta até lá se o mundo caminhar para isso.

- Bom, olhe 50 anos pra trás, em 1965. Não se fazia sexo fora do casamento de forma aberta, não se beijava na boca na rua, não se ia para festas como vamos hoje. É como você disse, quebra de paradigmas. Eu faço questão de estar vivo pra assistir. - retrucou sem criar animosidades.

- Diria mais, - ele complementou, - desde que me deem netos, meus filhos podem agir como quiserem nesse ponto.

E ela:

- Ah, bom! Também acho!

- Seus filhos? Tem certeza? - dessa vez ele foi provocativo.

- Sim, ué. Só acho que não funciona para mim. - ela encerrou o assunto, deixando a tréplica guardada na cabeça de Renato, sem que ele dissesse se funcionaria para si ou não.

Do bate-papo, seguiram para a cama para ver o filme. A película trata de um rapaz que sofreu um acidente e tem perda de memória recente. Para refletir isso, as cenas são em ordem anti-cronológica, com as cenas futuras sendo mostradas antes e o filme terminando na primeira cena temporal. Provavelmente não fui claro o suficiente na explicação, mas recomendo a todos que vão atrás para assistir porque vale a pena (tem no Netflix).

Alice achou o filme muito pesado para ser acompanhado, "exige muita atenção e me cansa". Ainda assim, classificou-o como "bom filme", para a alegria do namorado, que fez a recomendação. Ao fim do longa, já perto da uma da madrugada, foram dormir cada um a sua maneira: ela esparramada com o edredom jogado ao lado e ele escondido embaixo dessa mesma peça de enxoval, como quem está em frio polar.

Um dia em função da cômoda nova (30/11/2015)

O celular despertou e foi sumariamente ignorado por Renato. Foi preciso que Alice viesse ao quarto em que ele estava para tirá-lo da letargia do estado "não acordado, não dormindo". Cabe ressaltar que, esta noite, como Eustachio estava na casa também, o namorado dormiu no quarto de visitas.

Renato só botou a roupa no corpo e saiu em menos de dez minutos, já que estava com o tempo contado para atravessar a cidade e chegar na sua casa a tempo de receber o montador do móvel que comprou. Ah sim, é a cômoda que foi comprada há mais de um mês, mas a loja conseguiu criar uma burocracia tremenda para agendar a montagem e calhou que o rapaz aceitou perder a manhã de uma segunda para que isso fosse finalmente feito.

Com o trânsito natural da metrópole, foi necessário quase uma centena de minutos para que ele percorresse o trecho que faz em 25 minutos com o tráfego livre. Mais sortudo do que prudente, ele chegou apenas cinco minutos antes do funcionário da loja.

O trabalhador pequeno e franzino, de sotaque nordestino acentuado, foi bastante ágil. Parecia ter o manual de montagem da cômoda gravado na cabeça, pelo que separava as peças retangulares aparentemente iguais em grupos e as fazia encaixar com parafusos e pregos sem apresentar dificuldade. Enquanto isso, Renato lia o jornal do dia que recebe por e-mail.

A leitura do periódico acabou antes do serviço do montador, e Renato passou a observá-lo finalizar o trabalho. Ele encaixou e testou as gavetas, acertou a porta de correr frontal e verificou a estabilidade do conjunto de um jeito bem peculiar: sacudindo a peça montada com força. De pronto, Renato visualizou em sua mente aquilo tudo ruindo e quebrando em estalos, mas não foi o que aconteceu. Apesar de um custo baixo, a cômoda montada estava firme e estável. Como quem pede aprovação, o funcionário do magazine olhou para o rapaz e sorriu sincero. "Pronto, doutor!".

Já passava das dez da manhã quando Renato serviu uma água a ele e o dispensou, faltando ainda se arrumar para ir trabalhar. Tomou seu banho matinal diário, vestiu roupa social e caminhou despreocupado pela rua, sem aparentar ter deixado toda a manhã de trabalho atrasar. Para ajudar, o sistema de carregamento automático do cartão de passagens de ônibus estava quebrado, pelo que ele ainda teve que retornar e passar no banco para sacar dinheiro e pagar a passagem com cédulas.

Assim que chegou no térreo do escritório, Laura o aguardava para almoçar. Foram no self-service de sempre comer a comida de sempre e reclamar da vida de sempre. Na volta, Renato dedicou-se ao que ainda dava para fazer com o tempo que lhe restava do dia útil e se desligou do mundo.

Foi para casa ao fim do dia bem leve, ouvindo podcast pela rua. Chegou em casa e deixou a leveza do lado de fora: tinha se esquecido que toda a bagunça da montagem do móvel fora deixada para trás. Caixas de papelão, isopor, sacos plásticos, além da poeira natural do móvel recém-desembalado. Pôs uma música animada para tocar e vestiu a fantasia mental de dona-de-casa pra tomar coragem para a arrumação.

Realmente a estratégia deu certo. Além de organizar a zona que ficou para trás, resolveu preencher o móvel novo com suas roupas que estavam esmagadas no armário, além de colocar a televisão e o PlayStation sobre ele, lugar definitivo desses eletrônicos. Terminou tudo era quase uma hora da madrugada, quando tomou um copo de suco e largou o corpo cansado sobre a cama para dormir.

Almoço a cinco (29/11/2015)

Pra variar, o quarto abafado e levemente iluminado acordou Renato e Alice relativamente cedo. Como o primeiro compromisso deles era só na hora do almoço, o casal decidiu gastar o tempo que tinham ocupando todos os espaços da cama e do box do banheiro. Quando o exercício acabou, se arrumaram e foram até a casa da mãe do rapaz para almoçarem a cinco: eles, Paloma, Thiago e a dona da casa.

Por trabalhar com isso e ser muito bom no que faz, quem assumiu o fogão foi o namorado da irmã. Ele se dispôs a fazer bife a cavalo, servido com arroz e feijão. Para Elza, não comedora de carne, foi uma berinjela a cavalo. Delicioso! Comeram e conversaram, fazendo daquele momento raro um período gostoso.

Renato e Alice fizeram uma horinha na casa da mulher por mais um tempo e depois foram até o shopping novo de Guarulhos, para que o rapaz começasse suas compras de Natal. Ele rodou o espaço de cima a baixo e não encontrou nada que chamasse sua atenção. Decidiu tomar um sorvete com a namorada para ficarem mais um tempo juntos, porque sabia que voltaria para São Paulo após o passeio no centro de compras e ela ficaria em sua cidade natal.

O casal se despediu no estacionamento, com cada um indo com seu próprio carro seguir sua programação. A de Renato era voltar a casa de sua mãe para lavar roupas. De quebra, ao chegar lá, viu que um café da tarde estava acontecendo e decidiu fazer parte. Além da mãe e da irmã, estavam João com sua mulher e Matilde, sua tia. Beliscou o que conseguiu à mesa para em seguida preparar a máquina para trabalhar na lavanderia.

Duas horas depois, já havia quase dez quilos de roupa limpa pendurada no varal, os convidados já haviam ido embora e o domingo decretava o início de seu fim. Faustão se despedia da audiência (sim, Elza assiste por causa da "Dança dos Famosos") e o Fantástico já dava as caras. Em seu celular, Renato leu que Alice também tinha dado as caras. Despretensiosa, ela convidou Renato para dormir lá e este aceitou, como sempre o faz quando está tudo bem.

Chegou na casa da namorada perto das dez da noite. Comeram pão com qualquer coisa pra preencher os estômagos e botaram um filme no Netflix para celebrarem o fim do final de semana.

Equilibrando as coisas no namoro (28/11/2015)

A boca seca e o gosto de "corrimão de metrô" na boca eram o preço a se pagar, junto com a dor de cabeça leve, pelo esbanjamento etílico da noite anterior. Nada insuportável, cabe o registro. Nesse estado, Renato foi a pé até o salão de cabeleireiro na quadra ao lado cortar o cabelo.

Já de cobertura nova, ele voltou pra casa de sua mãe, tomou um banho e foi pra própria casa encontrar Alice, já que tinham programado um almoço juntos em um restaurante austríaco. Ele se trocou e se arrumou o melhor que pôde pra receber a namorada, que chegou menos de dez minutos após ele ter mandado mensagem para ela dizendo que só a aguardava. Ela também tinha tido o maior esmero para se apresentar e o casal estava esplêndido.

O restaurante em si era bastante aconchegante, um clima quase intimista sem chegar no introspectivo. Uma casa adaptada, com paredes rústicas e mesas de madeira. Os garçons foram extremamente atenciosos durante todo o período e até o dono veio papear com o casal, sem invadir o espaço deles. Um ótimo momento.

O vinho que acompanhou a comida excelente escancarou para o casal que ambos tinham dormido pouco na noite anterior e precisavam descansar. Os olhos pesavam e houve uma batalha intensa contra o corpo para que ambos se mantivessem acordados até chegarem em Guarulhos, na casa dela.

Depois de uma pequena soneca, de pouco mais de uma hora, eles se acordaram e ficaram conversando na cama. O caminho natural que o diálogo trilhou trouxe a ele a oportunidade de finalmente digerir a questão da viagem de Alice ao interior e o festival de música eletrônica. Renato começou filosofando:

- Sabe o que me incomoda? Não é o processo, é o resultado: você comenta comigo que pretende ir pra algum lugar sozinha e eu digo "OK". Eu falo que pretendo ir para algum lugar sozinho e você reage negativamente, às vezes até fechando o tempo...

- Não entendi. Eu comento as coisas com você exatamente para você poder emitir opinião. Suas opiniões são sempre favoráveis, ué.

- É exatamente esse o ponto. Você sabe que eu sou bem tranquilo com relação a isso, mas você não é. Me parece que, ao se dar conta que existe essa diferença, você meio que abusa da situação, fazendo o que tem vontade porque sabe que sou flexível, mas não abre a mesma possibilidade para mim porque se incomoda se eu fizer exatamente o que dou espaço para você fazer.

- Ah, Rê! Não sei se estou vendo onde você quer chegar...

- Se eu sou flexível, mas não posso viver sob regras flexível, então não quero mais ser flexível com você. Vou tentar manter a mesma rigidez que você exige de mim. Eu acho ruim isso, mas acho pior me chatear com as reflexões que faço sobre essa assimetria.

- Bom, essa é uma informação nova pra mim! Não sabia que te incomodava isso que você chamou de assimetria. Tudo bem se você prefere mudar a forma de agir; vamos ver o que dá.

E ambos olharam em silêncio para o ventilador de teto que girava calmamente apenas para refrescar o ambiente. Finalmente Renato engoliu o que ia e voltava do seu estômago nos últimos dias.

O celular do rapaz a tocar cortou a mudeza do quarto. Era Esponja chamando o casal para um barzinho à noite, coisa de duas horas a frente. Em conjunto, ele e ela decidiram aceitar o convite e foram se arrumar para sair.

O bar era uma casa de cervejas nova da cidade, inaugurada há menos de um mês. Até por isso, era menos cheia e o atendimento ainda estava de primeira. Encabeçaram os pedidos de cerveja Esponja e Alice, com os respectivos namorado e namorada vindo atrás em frequência menor de solicitação do garçom. Foram três horas de bate-papo e degustação cervejeira.

Quando aaíram de lá Renato assumiu o volante, já que Alice estava se queixando de uma leve dor de cabeça e um pouco de moleza. Os dois foram para o apartamento de Renato e caíram na cama depois de cinco passos lá dentro, com o corpo cansado pela quantidade de horas de sono em atraso.

Uísque e charuto (27/11/2015)

Sexta-feira! Dia de relaxar, de trabalhar com menos vigor (se possível) e de happy hour (desejável). Para Renato, uma ocasião extra o fazia ansiar pela sexta: hoje ele se encontrará com o padrinho para fumarem charutos cubanos e tomarem uísque single malt. Momentos para ele brincar de ser gente grande.

A primeira gota de alegria pingou quando viu sua morena dormindo ao seu lado despertar vagarosamente junto consigo. Se arrumaram conversando e ouvindo música, deixando tudo mais leve e quase os fazendo perder a hora. Ela o deixou no ponto de ônibus e seguiu para Guarulhos para trabalhar.

Como sempre, Renato chegou no escritório passados dez ou quinze minutos de seu horário oficial de início de expediente. Foi direto à sala de reuniões acreditando estar atrasado, mas deparou com ela vazia. Mateus, que tinha solicitado o encontro de equipe, estava mais atrasado do que ele, enquanto Laura aguardava o gestor em sua própria mesa.

Como sempre também, Mateus chegou e tornou uma reunião em outra, desvirtuando o assunto original e trazendo á mesa questões paralelas de outro projeto que ele tocava e precisava da ajuda dos dois liderados. Pelo comunicador interno da empresa, Laura viu uma mensagem de seu colega aparecer na tela "Ele não vai conseguir estragar o meu humor hoje". Renato tratou de se tranquilizar e operar em modo padrão burocrático. Desta forma, não tardou para que o horário do almoço chegasse.

Quando veio, foram comer juntos apenas o rapaz e sua parceira no departamento. Escolheram ir ao mesmo espaço de food truck em que há dias Renato tomou a sonífera Michelada. Desta vez ele optou por algo que permitisse que ele ficasse alerta até o fim do tempo de trabalho e escolheu comida sueca. De forma bem simplificada, eram almôndegas com purê de batata e salada. Entretanto, os temperos utilizados eram totalmente diferentes e davam um sabor característico e único àquela culinária. Foi uma boa pedida; ponto para a felicidade!

À tarde, as horas foram tomadas pela fatídica reunião de apresentação final do projeto. Todas as dificuldades e transtornos das últimas semanas serviram para alguma coisa, e essa coisa foi colocada à prova da diretoria naquele período. O resultado foi abertamente positivo! Apesar de pedirem algumas melhorias, os gestores aprovaram de forma unânime o projeto e ele será implantado no ano de 2016.

Com essa conquista em baixo do braço e um sorriso nos lábios, Renato se despediu da semana de trabalho. Deixou o escritório e foi pra casa pegar o uísque e o charuto para seguir com o plano. Alice foi se encontrar com as amigas em um "Clube da Luluzinha" e o namorado se sentiu bem à vontade para aproveitar aquele momento masculino com o padrinho.

Imagine duas pessoas que gostam de assuntos polêmicos e têm uma retórica poderosa. Esse era o par Renato e João. Das 10 da noite a quase duas da madrugada, eles falaram ininterruptamente sobre religião, família e política, majoritariamente. Até passearem por culinária rapidamente, mas não foi o foco. O rapaz saiu de lá revigorado mentalmente, apesar de levemente embriagado.

Foi dormir na casa de Elza, já que no dia seguinte teria que ir ao cabeleireiro que fica a uma quadra de lá. Antes de se entregar de vez ao colchão, verificou as mensagens ao celular e viu que havia uma pequena bronca da namorada: "Quando achar meu namorado, me avisa". Ele respondeu jocosamente "Achei!" e complementou com uma carinha de sorriso, pelo que ela "Queria falar com você, mas você não me respondia!". Ele: "O celular estava na parede, carregando... Esqueci dele e da vida.". Ela , encerrando: "Não faça mais isso.".

Renato ignorou o tom paternalista e impositor daquela frase de conclusão. Não a respondeu. Preferiu virar de lado, desligar o aparelho e dormir tranquilamente.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Ciúme vai, ciúme vem (26/11/2015)

A noite de sono foi péssima. Apesar do excelente hotel, Renato dormiu com o medo permanente de perder o voo. Isso implicou em ter acordado várias vezes durante as cinco horas que tinha pra de fato descansar, o que o deixou com sono durante boa parte do dia. Ele saiu tão cedo do hotel que nem o café da manhã havia sido servido ainda. Tomou-o no aeroporto, enquanto aguardava chamarem seu embarque.

Chegou em São Paulo e foi buscar seu carro na casa de Alice. Ela não estava lá, mas deixou liberada na portaria sua entrada. Dali, rumou para seu apartamento, deixou o carro e seguiu para o escritório para, aí sim, trabalhar. Todo esse processo o fez chegar no destino final próximo da hora do almoço.

"Vai almoçar onde?" apitou uma mensagem no celular de Renato. Era Laura buscando companhia para comer. "Aí", respondeu sucinto, prestes a entrar no edifício comercial sede da empresa. Combinaram irem à praça de alimentação do shopping, já que a moça precisava comprar presente de Natal para uma criança "adotada" por ela no Natal, através de uma entidade de assistência a menores abandonados.

Ele hambúrguer gourmet, ela estrogonofe. Depois, uma mochila cor-de-rosa e uma Barbie. Em menos de uma hora e meia estavam de volta para trabalhar, na cabeça de Renato um recorde para uma mulher visitar um shopping. Na verdade, até pra ele mesmo.

À tarde, descobriu que teria "trabalho surpresa" para entregar ainda hoje, o que provavelmente o faria permanecer bem além do horário regular do expediente. Quando buscou o celular para contar a má notícia a Alice, topou com uma mensagem dela: "Minha cunhada surtou!".

Evidentemente sem entender o que acontecia, o rapaz se assustou. Poderia ser uma forma de se expressar, uma gíria, ou talvez a mulher tivesse de fato entrado em uma crise esquizofrênica inesperada e inédita. A criatividade dele, tão conhecida pelas pessoas próximas a si, permitia tratar esses devaneios com certa seriedade, pelo que Renato tratou de pedir maiores explicações.

Antes de dizer a resposta da namorada, sigo com um breve relato. Em 2009, Eustachio Júnior (chamarei-o apenas de Júnior, como todos fazem) e sua atual esposa estavam separados, depois de terem namorado por um tempo (sim, as histórias são ridiculamente repetitivas). Alice estava no último ano da faculdade e convidou o irmão para ir a uma festa universitária na cidade em que estudava, pelo que foi prontamente atendida. Nessa festa, ele beijou uma amiga da irmã e ficou com ela o fim de semana inteiro, mesmo sob protestos de Alice. Depois do ocorrido, o casal efêmero nunca mais se falou.

Apesar disso, a atual esposa de Júnior soube do ocorrido, mas não se pronunciou por não ter nenhuma relação com ele à época. Quando retomaram o namoro, que veio a se tornar o casamento atual, ela comentou com o futuro marido que sabia com quem ele tinha saído no período de separação.

Voltando aos dias de hoje, entre duas e três semanas atrás, Alice foi encontrar a tal da moça, que não via havia quatro anos. Ela postou uma foto do encontro nas redes sociais, que foi vista pela cunhada nesta manhã. Instantaneamente, esta passou a derramar ofensas e agressões verbais em Alice pelo Whatsapp, sem fazer questão de ouvir o outro lado. Chamou-a de mentirosa, falsa, traiçoeira e coisas piores, desnecessárias de serem reproduzidas. Apesar de ter aguentado por um tempo, a namorada de Renato passou a revidar quando sua (pouca) paciência se esgotou. O clima ficou péssimo!

Nosso protagonista chamou Alice para ir a sua casa ao fim do dia, para poder dar algum tipo de suporte a ela. A moça aceitou e marcaram de se falar assim que ele saísse do escritório.

Conseguiu se desvencilhar dos principais afazeres diárias só às oito e meia da noite, mas manteve o plano. O casal se reuniu pouco antes das dez na frente do apartamento dele, e seguiram para a padaria de sempre para comerem e espairecerem.

Alice roía as unhas nervosamente. Alternava a manutenção de trocas de mensagens (grosserias?) com a cunhada com goles da cerveja que pediu, única coisa que ingeriu desde a tarde, e até o fim do dia. Renato buscava de todo jeito distraí-la ou fazê-la expulsar de uma vez o que a incomodava, mas não conseguiu. A namorada ficava longos períodos em silêncio, olhando para o infinito sem se expressar. Via o celular vibrar, pegava o aparelho na mão, digitava mais um pouco, jogava-o sobre a mesa irritada e voltada a ficar em silêncio. Às vezes, soltava algo como "Ela é louca!", "Ah, me ajuda!", "Foda... Foda...". Contudo, a frase que ficou realmente registrada por Renato foi "Sabe o que eu acho? Que ela é insegura em relação ao meu irmão, ferve de ciúme e arrumou uma válvula de escape. Sobrou pra mim!".

Ele aquiesceu silencioso, refletindo sobre o quanto isso se aplicava ao seu próprio relacionamento. Depois disso, entrou em modo reflexivo também e o casal foi pro apartamento de Renato quase que em silêncio absoluto. Dormiram só desejando um sincero "Boa noite, namorado!" e "Boa noite, florzinha!" um ao outro.

Brasília (25/11/2015)

O celular despertou pouco depois das sete da manhã. Alice parecia bastante atenciosa, mais do que o de costume, ou a cabeça ainda inconformada de Renato queria crer que ela tentava se redimir pelo ato de condenar a ida do rapaz ao festival de música eletrônica. A moça foi se arrumar antes dele, já que este faria home-office até o horário do voo para a capital do país e poderia enrolar um pouco mais na cama.

Ele se levantou quando a namorada foi se despedir. Ela saiu pela porta e Renato entrou no chuveiro. Depois de um tempo, já trocado e com o café-da-manhã sempre bem servido daquela casa, abriu o notebook e começou a trabalhar. Ainda pela manhã, o celular vibrou e trouxe a mensagem de Alice: "Muito bom acordar e ter vc do meu lado ou no quarto ao lado...".

O impacto foi ambíguo. Por um lado, era incomum ela falar coisas românticas de forma espontânea. Contudo, ainda pairava sobre o rapaz a sombra da discussão do dia anterior sobre ir ou não ao tal festival, enquanto ela iria para o interior e ele nem a questionara uma vírgula sobre o que ela faria e com quem estaria. Ruminou mais um pouco o ranço todo e voltou a engolir. Ainda não seria ali o momento da digestão.

Poucos minutos depois do meio-dia, Alice entrou de volta pela porta principal e cumprimentou a todos. Viera para almoçarem juntos. Como sempre, a habilidosa empregada já os aguardava com uma comida vistosa, cheirosa e saborosa. O casal almoçou e Renato preparou-se para sair. Para evitar o erro da última vez, ele tomou o táxi com bastante antecedência. Chegou no aeroporto, tomou um suco e aguardou sua hora de embarcar.

O voo foi tranquilo e já se aproximando, observando a arquitetura e a urbanização de Brasília, veio-lhe à mente aquele trecho de Faroeste Caboclo: "Meu Deus, mais que cidade linda!". Tudo era maravilhoso de cima e se provou tão ou mais surpreendente de baixo, olhando-a de dentro do táxi. Poucos semáforos, avenidas largas, uma sensação de que todo o concreto brotara ali no cerrado como árvores majestosas a requerer seu espaço de direito no campo visual.

Infelizmente, para sua frustração, ele teria que ir direto à conferência a que fora atender e não teria tempo para turismo. Prometeu-se, entretanto, voltar ali o mais breve possível para se deliciar com o que tinha tocado com os olhos.

O evento em si foi entediante. Renato passou o tempo todo lendo jornal ou matérias de portais de seu interesse enquanto velhos burocratas falavam frases prontas e de efeito no palco. Nada de útil, nada de novidade. A tortura intelectual acabou por volta das oito da noite, pelo que ele foi direto ao hotel e ficou por lá, assistindo lutas no notebook até o sono vir e o encaminhar para a cama.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Jogos Vorazes (24/11/2015)

O que deveria parecer uma rotina acabou sendo quase uma novidade para Renato naquela manhã. Tomar banho em seu banheiro, arrumar-se sozinho em seu apartamento, preparar o próprio café da manhã e sair de casa. Esse conjunto de atividades, todas juntas no mesmo dia, não era executada pelo rapaz havia um bom tempo.

Foi pro trabalho ouvindo um bom podcast e dedicou a manhã a afazeres pessoais, além de resolver pequenas pendências simples do trabalho. Foi almoçar sozinho, lendo jornal no iPad. Pela tarde, além de focar no trabalho mais intenso, combinou de pegar um cinema com Alice e de dormir na casa dela, já que viajará amanhã a tarde para Brasília pelo aeroporto de Guarulhos.

Para dar tempo de chegar à sessão escolhida por eles, Renato saiu uma hora mais cedo do escritório e rumou de ônibus para seu apartamento. O tempo de espera somado dos dois ônibus que tem que pegar não passou de um minuto, prenúncio de um fio de sorte sobre o trânsito. Em casa, depois de arrumar a mala para a viagem do dia seguinte, foi de carro para Guarulhos e demorou o que normalmente demora em um fim de semana tranquilo. Definitivamente aquele dia parecia sorrir-lhe com ternura. Ele só saberia que era um riso de escárnio mais tarde.

Ao chegar no condomínio da moça, teve que subir porque ela ainda não estava pronta. Tinham tempo sobrando, uma vez que o que Renato estimou como tempo de deslocamento foi maior do que o que de fato ocorreu. Alice terminou seus preparativos e o casal seguiu para o shopping, vendo que ainda tinham tempo para uma refeição breve antes do filme.

Não havia terminado a segunda quadra que passavam de carro quando Alice disse:

- Rê, na semana em que você estará todos os dias no interior, será feriado na terça aqui em Guarulhos. Pretendo ir pra São Carlos, na casa de uma amiga, tudo bem?

Daqui duas semanas, Renato fará essa viagem citada a trabalho.

- OK, sem problemas. Você vai quando?

- Pensei em ir no sábado a tarde. A gente almoça juntos e depois eu pego a estrada.

- Beleza...

Por alguns instantes, Renato pensou como poderia ocupar o fim de semana sem a companhia da namorada e, em um estalo, lembrou-se que no sábado citado estaria ocorrendo um grande festival de música eletrônica em São Paulo, que ele até havia convidado Alice, mas ela declinou argumentando que não gostava de festivais (o que implicava em ele não ir ou arrumar uma grande confusão).

- Ow, acabou de me ocorrer!... Quão incomodada você ficaria se eu fosse àquele festival de música eletrônica de que te falei, já que você não estará por aqui?

- Bom, Rê! Quer ir, vai! Faz o que você achar que deve fazer! - respondeu a namorada em tom de desconforto e irritação. Isso já foi um soco no fígado de Renato, que tentou argumentar positivamente.

- Estou perguntando quão incomodada você ficaria. Você não respondeu minha pergunta. - ele também subiu o tom um pouco.

- Bastante incomodada!

- OK, viu como é simples responder?! Eu não irei, pronto. Resolvido...

E o silêncio imperou no carro até a chegada deles no destino.

Na cabeça de Renato, uma tristeza com a situação toda se abatia. Esse era o terceiro evento a que Alice iria sem convidá-lo ou considerar sua presença, pelo que ele realmente não se chateia. Contudo, puxando pela memória, ele é capaz de se lembrar que algumas das principais brigas da primeira época de namoro foi porque ele fazia a mesma coisa e ela reagia de forma intensa. O rapaz decidiu que iria ruminar a situação ao invés de relevá-la. E isso não é um bom sinal.

No shopping, compraram os ingressos e, com os 25 minutos de intervalo que tinham até a sessão começar, foram comer algo na praça de alimentação. O papo foi voltando aos poucos, sem que a viagem ou o festival entrassem na pauta. A extensão do filme, de duas horas e pouco, também ajudou a acalmar os ânimos.

O casal saiu de um shopping vazio e Renato sentia um vazio semelhante em si. Sua cabeça estava em velocidade máxima pensando sobre tudo o que envolvia um relacionamento entre duas pessoas e sua tagarelice característica foi contida. Se percebeu ou se ficou incomodada, Alice não falou.

Dormiram fisicamente juntos, mas Renato preferiu ficar dentro da própria mente dividindo espaço com a notícia da viagem de Alice.

De volta à realidade (23/11/2015)

Renato acordou e não tardou para se arrumar. Sentia um vigor atípico para uma manhã, provavelmente reflexo do descanso que o feriado proporcionou. Conforme havia acertado com sua irmã na noite anterior, o rapaz saiu cedo da casa de Alice, foi até a casa de sua mãe encontrar Paloma, vestiu uma roupa improvisada para ir trabalhar (não tinha vestuário social completo nem na namorada, nem da casa de Elza) e seguiu de transporte público até o escritório em companhia fraterna.

Pra variar um pouco, no começo do expediente havia uma reunião que Mateus convocou e não utilizou adequadamente: este chegou atrasado, divergiu do tema inicial e encerrou sem necessariamente ter corrido os assuntos que disse que pretendia. A manhã de Renato escorreu pelo ralo da improdutividade não intencional.

Almoçou com Laura, como de praxe às segundas-feiras, e falaram do feriado e da cachorra dela, que estava resfriada (o rapaz jura que nunca tinha ouvido falar de cachorro resfriado na vida). Na volta, mesclou as obrigações laborais com a programação do próximo final de semana. Uma amiga que ele não vê há mais de um ano virá no próximo sábado para confraternizarem; acertou com Alice um almoço em um restaurante austríaco; os detalhes finais do aluguel da casa do Réveillon serão alinhavados pela manhã (sim, finalmente deu certo!), a pedido de Paloma; se tudo correr bem, há ainda uma cervejaria artesanal para encerrar a noite do último dia da semana.

Pouco depois das 19 horas, quando termina seu horário oficial de labuta, Renato seguiu para a casa de sua mãe de volta, onde havia deixado seu carro pela manhã, para buscar, além do veículo, roupas passadas. Ao entrar, deparou-se com Carla sentada no sofá terminando de entregar a venda de cosméticos de catálogo que havia feito para Elza. Aproveitou a grata surpresa para tagarelar com a moça enquanto comia alguma coisa e recolhia o que viera buscar ali.

O rapaz saiu da casa de sua mãe pouco antes das 22 e chegou em seu apartamento meia hora depois. Como há muito não fazia, deitou sozinho em sua própria cama e tratou de relaxar ouvindo os sons típicos dali: a buzina do trem, os ônibus sobre o viaduto, a voz alta das poucas pessoas que transitam na rua àquela hora. Dormiu como se isso fosse o zumbido suave do ventilador que embala o sono em noites quentes.

Praia com amigos do trabalho (22/11/2015)

Como haviam ido dormir relativamente cedo, o casal de namorados acordou cedo também. No celular de Renato, uma mensagem de Andressa informava que ela e alguns amigos estavam em um quiosque a três quadras de onde ficava o apartamento de Alice, pelo que eles marcaram de se encontrar lá mais tarde, assim que o terminassem de se arrumar.

Por "se arrumar", entenda todo o processo que um casal recém-unido passa entre abrir os olhos sobre a cama e sair pela porta da frente. Primeiramente, namorar um pouquinho. Depois, uma boa ducha a dois, que Renato não dispensava (nem a água, nem a companhia), como já foi possível perceber. O café da manhã com a TV ligada em um canal de música faz tudo ser mais lento. Em resumo, os dois foram deixar o apartamento era quase meio-dia. Uma mensagem de Andressa avisava: "Nossa, que demora! Quando chegarem a gente já estará bêbado!". "Prioridades, mulher..." pensou o rapaz, ignorando o aviso em tom cômico.

Eles seguiram a pé até a praia e no caminho Alice advertiu: "Você pretende ficar muito? A gente pode só fazer um social e achar outro lugar pra ficar, né?". "OK, sem problemas", respondeu Renato, conhecendo o perfil da namorada.

Encontraram o grupo na areia rapidamente, se sentaram e o assunto desatou com facilidade. Falaram de homens da praia (eram quatro mulheres, incluindo Alice e Andressa, e um rapaz homossexual), falaram de homens por quem tinham queda, falaram de comida, falaram de homens que comiam bem (entendam como quiserem), falaram de música, falaram de homens que dançam e nesse ritmo foram misturando assuntos de forma empilhada, sem aparente relação entre si. A única coisa que estava presente em todo o momento era o riso, ora contido, ora escandaloso, dos seis embaixo de um guarda-sol.

Pouco mais de uma hora depois de terem chegado, Renato falou discretamente no ouvido de Alice: "Quando quiser ir embora, me avisa.". "Pode deixar, estou bem aqui." foi a resposta.

Assim a tarde se seguiu, ociosa e divertida. Surpreendentemente, a moça permaneceu firme lá e até se envolveu em alguns momentos nos assuntos discutidos. Já se aproximava as quatro da tarde quando ela pediu para ir embora. Todos se despediram e o casal voltou para casa. No caminho, a curiosidade de Renato extravasou sua boca e perguntou: "Você não disse que queria ficar pouco?". E ela: "Quando sou bem recebida, não me importo em ficar o tempo que for.". Uma boa resposta para a pergunta, uma ponta de felicidade para Renato e uma pequena indireta para suas amizades da faculdade.

Já recolhidos, foram para o fogão preparar o almoço: espaguete do cozinheiro doido do dia anterior requentado com um par de bifes de picanha frito. Para o estado praiano em que estavam, um banquete. Daí se seguiu uma chuveirada e uma soneca, que durou até pouco depois das oito.
Ao acordarem, o clima era um misto de tristeza pelo fim do feriado e satisfação pelo que fizeram juntos ali. Arrumaram as coisas e, em menos de duas horas, estavam na estrada subindo a serra.

Já em São Paulo, mais especificamente em Guarulhos, ainda arrumaram tempo para comer algo na padaria 24 horas da cidade antes e ampliarem a sequência de dias em que passaram a noite juntos.

Mais um dia de praia (21/11/2015)

O plano era dormir cedo para acordar cedo. Mas não funcionou. Os dois casais despertaram por volta das 10 da manhã e trocaram mensagens por celular, combinando se encontrarem na sala do apartamento em uma hora. Todos nós sabemos o que fariam nesses 60 minutos que deram uns aos outros.

O "café-da-manhã", tomado em uma frutaria de esquina na rua de cima de onde estavam, foi gostoso, mas o atendimento foi péssimo, assunto colocado forçosamente em pauta pela situação e usado como fagulha para iniciarem os trabalhos verborrágicos do dia.

Quando voltaram ao apartamento, de acordo com o que tinham decidido minutos antes, os quatro se arrumaram para aproveitarem a praia. Dez minutos para os rapazes, vinte para as moças e todos já podiam sair.

O tempo estava nublado, quase a continuação do tempo fechado com chuvisco da noite anterior, mas sem água alguma vir do céu. Temerosos com a possibilidade de ela resolver descer de uma vez em uma enxurrada, eles preferiram pegar uma mesa na parte coberta do quiosque. Cerveja, casquinha de siri e mais conversa fiada. Três horas disso.

Suco de cevada estufa, mas não alimenta. A frase popular foi comprovada quando alguém à mesa comentou de comerem algo de mais sustança e todos concordaram desesperadamente. Pediram a conta e foram atrás de um restaurante árabe sugerido por uma colega de Esponja e Duende que trabalhara naquela cidade por mais de um ano.

Foram quibes e esfirras até não caberem mais. Aí pediram kibe cru e empurraram com mais cerveja, cujo primeiro pedido fora feito na abertura da conta e já se contava a terceira garrafa. Mente relaxada, corpo empanturrado, faltava só deixar a alma dar uma volta fora do corpo. E foi o que fizeram.

Com certa dificuldade até para caminhar depois de abusarem da capacidade do estômago, o grupo seguiu de volta para o apartamento e os rapazes de sentaram no sofá, com as respectivas namoradas com as cabeças eu seus colos e o resto largado no espaço que sobrou do móvel da sala. Um a um, os quatro cochilaram por um tempo, até quase escurecer. Também um a um, eles foram acordando e se acordando aos bocejos.

Esponja finalmente se levantou e se espreguiçou a exaustão. Pediu que a namorada fizesse o mesmo e os dois anunciaram que partiriam. Alice e Renato fizeram a famosa cortesia de solicitar que ficassem mais um pouco, ofereceram a casa mais um dia, mas o outro Renato insistiu que precisava voltar para São Paulo ainda hoje.

Despediram-se na porta do carro dos visitantes e o casal que ficou voltou a fazer preguiça no sofá. Na TV, um documentário sobre o Estado Islâmico prendeu a atenção do nosso protagonista enquanto sua namorada brincava com sua cachorra (ela veio com eles ontem) e caçava o que fazer pela casa. Quando o vídeo acabou, os dois saíram para procurar o que comer e acabaram em um bistrô italiano de um senhor pitoresco. O próprio, com um sotaque praiano, se dizia italiano, cozinhava todos os pratos que servia e contava "causos" os clientes, dos acidentes que sofrera às namoradas quase 30 anos mais nova que vira-e-mexe arrumava.

Foi uma noite agradável de comida boa e bastante risada. O par embrulhou a comida restante e a levou para ser o almoço do dia seguinte. Foram dormir perto da meia-noite, arrumando tempo para namorar mais um pouquinho.

Visita inesperada (20/11/2015)

"Meu Deus, que cama maravilhosa!". Esse foi o primeiro pensamento de Renato ao abrir os olhos, com o dia já claro. Alice dormitava ao seu lado, na iminência de acordar também. Fosse pelo corpo cansado, fosse pelo estado de relaxamento que o rapaz alcançou, o colchão embaixo de si parecia ser de nuvens macias envoltas em seda.

Quando o casal trocou olhares, um sorriu gentilmente para o outro e se gastou um bom tempo juntos ali. Depois, uma ducha matinal para lavar a preguiça restante e os dois saíram do quarto principal do apartamento, perto do meio-dia. Tomaram café-da-manhã independentemente do horário, uma vez que se trata de um feriado e o formalismo do relógio não é bem-vindo.

Saciados, Renato e Alice combinaram de descerem à praia e foram vestir a roupa de banho. Protetor solar passado, óculos de sol no rosto, chinelo no pé e rua. Andaram por duas quadras até a areia e escolheram uma barraca para repousar.

O dia passava por seus olhos junto com os vendedores ambulantes que anunciavam cocos, milhos e queijos. Junto com as crianças que corriam atrás de bolas ou mergulhavam para fugir das ondas. Junto com os belos corpos expostos, masculinos e femininos, que atraíam olhares discretos dele ou dela, resguardados pelas lentes escuras. Ela tomou duas cervejas, ele três refrigerantes. Comeram pastéis também antes de partir, quando o sol ameaçava se esconder atrás dos prédios à beira da orla.

Chegaram de volta ao condomínio da moça e foram à piscina na cobertura. Para Renato, era estranho passar tanto tempo com alguém e não vir à cabeça nenhum assunto que pudesse despertar a atenção de ambos. Alice gosta de cachorros e odontologia, e isso é tudo o que ele consegue pensar quando quer fisgar o papo com a namorada. Mas não estava afim de falar disso hoje e o silêncio foi a principal comunicação entre eles durante grande parte dos momentos.

Curiosamente, algo aconteceu que tratou de alterar essa situação. Seu amigo de faculdade, também chamado Renato, apelido Esponja, tinha descido com a namorada para a mesma cidade de praia em que nosso protagonista estava e não conseguiu achar hospedagem de última hora. Tendo o rapaz comentando o fato com Alice, esta ofereceu seu apartamento ao casal desalojado e em coisa de uma hora eles se encontraram.

- Caraca, Duende! Quanto tempo eu não te vejo! - de fato, fazia uns seis meses. A propósito, Duende é o apelido de faculdade do Renato destes relatos.

- Nem me fala, Esponja! Bom te ver, rapaz! - e retribuiu o aperto de mãos do amigo com um abraço.

A dupla rompeu o silêncio como a polícia invade um cativeiro. Instantaneamente, começou uma tagarelice sem fim entre os dois engenheiros, enquanto as moças se entreolhavam e riam da situação, esporadicamente comentando que não estavam entendendo nada do assunto que era tratado: essencialmente engenharia.

Depois de serem parados pelas respectivas namoradas para que elas fossem inseridas na conversa, o quarteto passou a falar de viagens e família enquanto se dirigiam à pizzaria do bairro, escolhida por unanimidade como o jantar deles.

O clima estava quente, mas o chuvisco do fim de dia ajudou a refrescar o ar morno que os circundava. A cerveja gelada também, em contraste com os pedaços de massa e queijo assados que ingeriam. Apesar das bocas ocupadas, o bate-papo animado não cessou por um minuto sequer.

Todos satisfeitos, os dois casais voltaram ao apartamento de Alice. Foram dormir relativamente cedo para poderem aproveitar melhor o dia seguinte desde a manhã. Com as costas naquele colchão dos deuses, não demorou até Renato cair em sono profundo, antes mesmo de a namorada voltar do banheiro em que tirava a maquiagem, vestia o pijama e se preparava para dormir.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Preparativos para o feriado (19/11/2015)

Duas datas interessantes se aproximavam: a entrega final do trabalho do ano inteiro e o feriado de três dias que novembro proporcionou. Para atender a primeira, Renato não se demorou em casa após acordar, chegou cedo no escritório e se pôs a finalizar o que faltava. Tanto que nem viu quando o sol a pino já convidada para o almoço e, ao mesmo tempo, exigia a busca desesperada por uma sombra.

O rapaz estava com vontade de comer algo diferente e seguiu para o food truck park que já havia visitado com Laura há umas semanas. Lá, foi a uma barraca de comida mexicana diferente do TexMex que se vê por aí. O prato principal era um espécie de cozido com carne de porco, boi e frango, bem temperado e com alguns legumes. Para acompanhar, tortillas e arroz com pimentão. O calor castigava e o vendedor aproveitou para oferecer mais uma coisa: Michelada. Trata-se de um copo bem servido de cerveja com gelo, limão e especiarias. Na borda, sal grosso bruto ressaltava sabores e provocava mais sede, tornando a bebida um ciclo perfeito de satisfação e desejo.

Renato deliciou-se com ambos, o prato e o drink. Comeu devagar, apreciando os sabores daquele prato exótico enquanto ouvia música no celular, como companhia. Fez questão de gastar cada um dos 60 minutos que tem de almoço naquele ode a boa refeição.

Voltar a trabalhar no mesmo ritmo depois de se alimentar foi penoso. Não tanto o cozido, mas a cerveja cobrava seu preço trazendo sonolência e falta de foco ao rapaz. Ele precisou caminhar um pouco, ir ao banheiro, lavar o rosto, tomar água gelada e pensou até em ir ao térreo correr para ver se pegava no tranco. Nada deu certo. Ele só se sentiu normal de novo perto da hora de sair.

Ainda na onda das consequências dos atentados de Paris, Renato voltou para casa engolindo mais material sobre o Estado Islâmico. Ele nem se importou que o ônibus que pega para ir embora demorava mais que o de costume; só se deu conta porque Alice o chamou com mensagens ao celular perguntando seu paradeiro.

O questionamento da moça fazia sentido. Hoje eles haviam marcado de se encontrarem na casa dela para viajarem para a praia, aproveitando o feriado na sexta para passarem três dias a sós no apartamento do pai dela. Eles foram se falando pelo caminho até a casa dele, onde rapidamente arrumou a mala para a viagem, e daí pra casa dela, onde jantaram algo para forrar o estômago.

Já era perto da meia-noite quando o casal partiu para descer a serra em busca do mar. Renato resistiu o quanto pôde, mas não conseguiu e dormiu a primeira meia hora na estrada. Fez companhia a Alice nos dois terços seguintes do trecho, falando de nada específico ou útil, apenas focado em fazer a moça rir e se sentir bem ao seu lado.

Tudo transcorreu bem e eles chegaram na praia ávidos por uma cama gostosa, que estava lá a esperá-los. Antes de deitarem, Renato conferiu o celular e viu que Andressa havia mandado uma mensagem. Tendo conversado com ele durante a semana, ela sabia do destino do amigo. Por pura coincidência, já que o feriado dela havia sido programado com bastante antecedência, ela lembrou o rapaz que também estaria naquela praia. Renato deixou a mente cansada devanear e refletir sobre quão estranha seria a situação das duas, Andressa e Alice, se encontrando.

Mudanças na equipe de trabalho (18/11/2015)

Por sorte, o ônibus que Renato toma para ir ao trabalho passa literalmente na porta do motel em que ele e Alice haviam passado a noite. Depois de namorarem um pouquinho e se arrumarem com pressa, ele se despediu da moça e se colocou em pé no ponto, aguardando a condução coletiva.

Hoje não havia distrações ao seu redor na empresa. Mateus estava em reuniões no Rio de Janeiro e Laura no escritório do interior. Quando quer, o rapaz torna-se um exemplar workaholic, pelo que vestiu essa máscara pouco depois das dez horas e não tirou mais.

Para não dizer que ficou no mesmo estado o dia todo, foi convidado para almoçar por dois trainees da engenharia, uma moça e um rapaz, e aceitou. Foi um momento agradável para relaxar um pouco fazendo duas coisas de que mais gosta: falar e discutir política. A garota pedira detalhes sobre o Estado Islâmico e sua relação com os atentados de Paris, e Renato desatou a explicar tudo o que havia lido na última semana sobre o assunto, da forma didática e às vezes até prolixa com que gosta de se expressar.

À tarde, o fone de ouvido o deixou apenas fisicamente no escritório. Mentalmente ele embarcou nos bits do notebook e até a noite só fez contas, projetos e projeções. Cabe ressaltar, contudo, que novamente os mesmos dois trainees foram os que tiraram Renato de seu transe laboral. Em uma reunião de emergência com a diretoria, o par foi informado que ambos seriam transferidos para uma unidade de negócios do Sul, com início na segunda-feira próxima.

Dado que nosso protagonista divide (dividia?) um apartamento no interior com rapaz transferido, ficou no ar a dúvida do futuro daquela mini-república que montaram. Isso provavelmente só será resolvido em uma semana ou duas, mas tirou a concentração de Renato e fez disso a pauta da vida daquele instante até ir para sua casa.

O dia seguiu sem mais novidades. Com Alice, acertou os pequenos detalhes pendentes da viagem que farão no feriado próximo. Com a irmã, formalizou o encerramento da procura por chácaras para o Ano Novo, sendo que sexta-feira ela visitará a última chance que eles vislumbram de fazerem algo diferente no Réveillon. Por fim, terminou a leitura de um profundo e extenso texto sobre o mesmo Estado Islâmico que fora assunto no almoço, já deitado em sua cama, pronto para dormir.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Balanço de um mês (17/11/2015)

Os olhos abriram e só. O corpo não se mexeu; não conseguia se mexer. Tudo doía depois do treino de jiu-jitsu de ontem. Levantar foi um processo, mais do que um ato.

O banho morno fazia todos os músculos das costas tremerem de forma esquisita antes de relaxarem. A mesma água sobre as juntas dos dedos esfoladas trazia ardor e incômodo. Renato, contudo, parecia satisfeito com aquela situação.

No espelho, ao se fitar escovando os dentes, viu as marcas sobre o olho e no pescoço. Procurou e achou mais delas por todo o corpo. Saiu de casa mancando e feliz.

Apesar de o corpo estar avariado, a mente descansada deu o melhor de si no escritório. Até dar a hora do almoço, voou como pôde entre planilhas e relatórios. Pouco depois do meio-dia, comeu o risoto que tinha sobrado do almoço com a mãe no final de semana e voltou para a sua mesa, a continuar com a excelente produtividade que desempenhara na manhã.

Já no fim do expediente, trocou mensagens com Alice e eles combinaram de se encontrar quando ambos tivessem saído dos respectivos trabalhos. O ponto de encontro foi a padaria a três quadras do apartamento do rapaz, onde sempre iam quando a geladeira e o armário da cozinha dele estavam vazios.

Enquanto aguardavam seus pedidos chegarem, a namorada de Renato propôs algo inusitado, prontamente aceito: dormiriam em um motel, para aproveitar a banheira de hidromassagem. O rapaz já se deliciou ao imaginar imergir o corpo desgastado na água quente e relaxante, acompanhado da sua morena. Comeram seus pratos rapidamente e seguiram para o destino sugerido pela moça, o segundo melhor da cidade de acordo com um site especializado no assunto. (Sim, existem sites de ranking de motéis)

Escolheram uma suíte intermediária, que fosse agradável, tivesse hidromassagem, mas que não cobrasse por supérfluos que não seriam usados. Dentro do quarto, trataram de encher a banheira e se despiram enquanto a torneira fazia seu serviço. Namoraram por um tempo aguardando o ponto ideal de preenchimento da hidro, sincronizando os corpos e as mentes como um casal em plenitude.

Deu o momento e eles entraram na mini piscina que tinham feito. Deitaram um ao lado do outro e ficaram visivelmente relaxados. Os olhos devagarinho iam se posicionando a meia abertura e a respiração tomava ritmo sonolento. Antes que dormissem, contudo, Alice começou a falar:

- Vamos fazer um balanço desse mês juntos?

- Vamos... - Renato aquiesceu com a voz sussurrada. - Pode começar!

- Não, eu propus então você começa. - ela divergiu.

Depois de trabalharem para decidirem a ordem de quem falaria em primeiro lugar, Renato decidiu dar início ao papo. Foi bem sucinto, contudo, revelando que não tinha grandes esperanças quando primeiro entrou em contato com ela depois de tanto tempo sem notícias, mas se sentia bastante satisfeito e feliz por ter dado tudo certo. Concluiu dizendo que via seu ato de buscá-la como uma confirmação de que a amava e a queria por perto.

Alice respirou fundo antes de seu pronunciamento. Parecia buscar as palavras certas, ou tornar sentimentos em palavras e estas em frases inteligíveis. Renato aguardou pacientemente até que ouviu:

- Eu também fiquei feliz com você ter me procurado. Inicialmente, eu achei que não daríamos certo. Entretanto, resolvi tentar ficar com você mesmo assim, na esperança de você não ser o Lucas com quem eu terminei o namoro, mas o novo que você disse que havia se tornado. Eu não tenho dúvidas dos meus sentimentos. Aliás, nunca tive.

O discurso tocou o coração de Renato porque Alice não era afeita a se abrir dessa forma com regularidade. Ainda assim, a última frase que ela soltou disparou uma série de pensamentos filosóficos em sua cabeça e ele se pôs a refletir. "Nunca tive dúvidas"... Nem quando quis terminar? Ou estava certa do sentimento de raiva ou qualquer outro sentimento negativo? Nunca teve hesitações em nenhum dia dos mais de duzentos em que ficaram separados? As perguntas pululavam uma atrás da outra. Pela insistência da namorada, que via em seus olhos que o cérebro funcionava a todo vapor, ele dividiu o que pensava de forma bastante difusa e incoerente, até porque ainda a ideia estava muito verde em sua mente.

A moça entendeu mal. Interpretou a confusão que foi dita de forma negativa e reagiu raivosa. Renato ainda tentou consertar, mas ainda estava em partes dentro de si mesmo. Era como uma pessoa tentando ajudar outra na rua, mas pela janela de casa, sem ir à calçada ou ao quintal. Por fim, pediu desculpas a ela pelo mal-entendido, fechou a cortina e permaneceu dentro de casa, ainda a maquinar.

Com o clima comprometido, restou-lhes o silêncio. A música de fundo, que estava bem baixa para que pudessem conversar, subitamente virou um protagonista murmurante a preencher o quarto com seu som.

Alice saiu primeiro da banheira quando a água já começava a ficar em temperatura corporal, seguida pelo namorado. Tomaram uma ducha juntos falando amenidades e foram dormir abraçados. Os corpos encostados ali eram a imagem diametralmente oposta das ideias que viajavam pelas cabeça, cada uma imersa em seus próprios pensamentos. Parou-se a música e o silêncio embalou o sono dos dois.

De volta ao jiu-jitsu (16/11/2015)

Mais cedo que o de costume, a musiquinha irritante, mas necessária, disparou no celular de Renato. Hora de mais um recomeço de rotina. Neste caso, alguns minutos mais cedo que o usual, já que Alice teria que voltar para Guarulhos a tempo de trabalhar também.

O casal se arrumou rápido e até deu tempo de Renato tomar um bom banho antes de sair. Ela levou o namorado até o ponto de ônibus e seguiu seu rumo. Ele, dali, foi com o coletivo até o escritório.

O dia de trabalho foi intenso, com a apresentação final do projeto se aproximando. Tudo deveria estar certo porque está em jogo 30% da Participação nos Resultados a que Renato tem direito anualmente. Não é muito, mas já ajuda a trocar de tablet ou comprar um video-game.

No meio da confusão do dia, Nami mandou-lhe duas mensagens. A primeira, antes do almoço, remarcando o café abandonado para aquela noite. O segundo, poucas horas antes de ele sair para o local marcado, desmarcando novamente. Renato via o padrão de anos atrás se repetir e se chateou apenas pelo tempo que demorou para ler a mensagem. Abstraiu-se da situação, respondeu à amiga de forma cortês e seguiu a vida.

A caminho de casa, realizou que teria a noite livre e se lembrou de uma academia de jiu-jitsu que vira pelo caminho, a cinco ou seis quadras de onde mora. Procurou o telefone na internet, ligou e agendou uma aula experimental para o mesmo dia. Correu em casa, resgatou o quimono empoeirado e a faixa "branca" já amarelada e encardida, comeu duas frutas e partiu para a os tatames.

O centro de treinamento funciona na sobreloja de uma oficina de som automotivo, em um espaço bastante parecido com o que Renato treinou por duas dezenas de meses há mais de dois anos. Por ser em um horário mais tarde só havia quatro alunos no momento, mas o rapaz observou que do horário anterior tinham quase 20 pessoas saindo da área de luta.

Depois de poucos minutos de conversa com o professor, começou a praticar. Ou a se torturar, já que havia muito tempo que não se exercitava e o corpo fazia questão de lembrar-lhe disso. O aquecimento levou o ar dos pulmões, a repetição da técnica do dia levou-lhe pedaços de pele das dobras dos dedos e a luta prática presenteou-lhe com roxos no rosto, no tronco, na axila e no pescoço. Apesar de tudo, ele foi embora dali feliz como não se sentia há tempos. O cansaço do lutador. A exaustão de quem se diverte levando-se ao limite. "A dor é a fraqueza saindo do corpo", é uma citação atribuída a Carlson Gracie que Renato gosta de proclamar para si e para os outros que perguntam por que ele faz isso.

Desnecessário dizer que da academia Renato foi direto para casa. Tomou um bom banho relaxante e desmaiou pouco depois de mandar mensagem de boa noite para a namorada.

Domingo com Elza e James Bond (15/11/2015)

Depois de ter ido dormir quase às cinco horas da manhã, Renato acordou perto da hora do almoço. Despertou sozinho, com os sons da rua e a agitação de dona Elza pela casa. Levantou-se e cumprimentou sua mãe carinhosamente, iniciando a atividade a que se dedicaria em grande parte do domingo: dar atenção àquela senhora.

Os dois conversaram por um tempo até que Paloma e Thiago saíram do quarto e se juntaram à dupla no bate-papo familiar à toa. De almoço, com a preguiça generalizada para cozinhar instalada, pediram risoto pelo aplicativo de celular, cada um de um tipo. Quando os pratos chegaram, serviram-se, mas também experimentaram um do outro o que haviam pedido de diferente, tradição da família de Renato desde os tempos em que sua avó era viva.

Com o sol próximo do fim da caminhada no céu, depois de ficarem dentro do apartamento o dia todo e tagarelado sem parar, Renato aproveitou que sua irmã foi levar o namorado ao trabalho e também se aprontou para sair. Precisava arrumar algumas coisas em sua própria casa enquanto ainda era domingo e o esmorecimento típico deste dia da semana não havia tomado conta de seu corpo.

Lá na residência do centro de São Paulo, só vestindo um shorts, a melhor indumentária na opinião do rapaz para os serviços de casa, ele se pôs a lavar louça, varrer o chão, trocar os lixos e diminuir as coisas jogadas, que quando morava com sua mãe iam de forma mágica para dentro do seu armário e sabe-se lá o porquê não vão mais. No meio da faxina, ou minifaxina, marcou um encontro com Alice para irem ao shopping tentarem sobrepor a frustração do dia anterior e finalmente assistir o filme do 007.

Em 40 minutos, Renato estava pronto para sair e a namorada o aguardava no térreo. O casal se cumprimentou e comentou entre si o dia de cada um enquanto tomavam o rumo da bilheteria. Sem surpresas, eles reservaram duas poltronas bem no centro da sala e viram o filme tranquilamente. De lá, dada a hora avançada, partiram diretamente de volta para o apartamento onde o rapaz estava e, para sua surpresa, Alice aceitou o pedido quase despretensioso que o namorado fizera para que ela dormisse ali.

Que se dane que era domingo! O importante, na visão dele, era ter aquela beleza cor de capuccino relaxada e dormindo ao seu lado em cada dia que fosse possível.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Confusão para conseguir uma casa para o Réveillon (14/11/2015)

O despertador chamou Renato cedo em pleno sábado. O rapaz havia combinado com sua irmã de visitarem uma chácara potencial para abrigar o evento de Ano Novo deles e precisava estar na casa dela antes das nove da manhã. Depois de se aprumar rapidamente e ir até o quarto de Alice para se despedir ao sair, ele pegou seu carro e seguiu a programação.

Estavam no veículo Paloma, Thiago e Renato. O clima era de descontração e o trecho rodoviário durou pouco mais de 30 minutos. Ao chegar no local oferecido, o trio se espantou. A casa era bem mais humilde do que a expectativa deles e do que a descrição da moça que os agenciava. De forma cortês, eles elogiaram o ambiente, mas trocaram olhares que conversavam entre si e confirmavam a unanimidade da negativa para aquela opção.

Eles foram embora frustrados. O assunto da volta focou em como o casal que oferecia a casa estava mal assessorado e como aquele ambiente precisaria de uma boa reforma antes de receber inquilinos de temporada. Galinhas por todo lado, cheiro de ração, um quarto trancado "porque não quero que ninguém use nosso quarto, tá?"...

Ainda enquanto ia em direção ao apartamento de sua mãe deixar sua irmã e o namorado, Renato combinou com Alice que almoçaria com ela. Ao chegar na casa dela, contudo, foi pego de surpresa pela notícia de que levariam Seu Eustachio ao aeroporto antes de comerem, o que fez o estômago dele torcer um pouco mais de fome.

Apesar de parte do corpo reclamar, outra parte aproveitou aquele pequeno passeio interessante, com o senhor bem à vontade no banco de traz, falando bastante e empolgado com a viagem para o Nordeste. Na volta, o rapaz confessou à moça o tamanho do buraco que havia em seu ser que deveria estar ocupado por algum alimento, pelo que ela riu do drama e se apressou no retorno.

Depois de almoçarem deliciosos pratos caseiros preparados pela empregada de Alice, o casal foi para o sofá digerir a refeição. Ela esparramada fuçava em suas redes sociais com a cabeça no colo de Renato. Este, pregado ao celular, discutia com a irmã as hipóteses que tinham para não passarem o Réveillon em branco (com o perdão do trocadilho). Em quase quarenta minutos de papo, decidiram fazer uma última investida por sites de temporada e começar a avaliar seriamente os planos B e C (ir para a chácara de Alice em Minas ou para a casa de Carina no Rio). Paloma se responsabilizou por esta tacada final, prometendo fazê-la na segunda-feira.

Depois de relaxar um pouco e jogar conversa fora com sua namorada, Renato propôs um cinema. Antes, passariam na casa dele para o rapaz poder tomar um banho e trocar de roupas.

Passaram-se quase duas horas entre terem saído de Guarulhos e entrado no shopping ao lado da casa do nosso protagonista. A intenção era assistir o novo filme de James Bond, o 007. Infelizmente, todos os horários possíveis estavam lotados e a tentativa foi frustrada. Trocaram a sessão por um passeio a uma hamburgueria ali perto com a intenção de assinarem mais uma parcela do consórcio para a ponte de safena que será obrigatória cedo ou tarde, continuado esse ritmo de qualidade de alimentação.

O relógio dava dez horas da noite e, de estômago cheio, Renato já se inquietava para ir embora. Apesar de amar a companhia de Alice, ele iria ver UFC sem a moça hoje porque ela não quis ir à casa de dona Elza, sede oficial das transmissões para ele. Hoje, os dois cinturões femininos são postos a prova no card principal, com promessa de um excelente nível técnico.

Ciente do compromisso do rapaz, a namorada terminou a refeição e o levou até a casa de sua mãe. Despediram-se carinhosamente e ela seguiu para seu próprio apartamento, enquanto ele correu para dentro a tempo de ver algumas lutas antes das duas já citadas.

Do que realmente importa, Joana Jedrzejczyk atropelou Valerie Letourneau para manter seu cinturão e Holly Holm surpreendeu a todos derrotando Ronda Rousey no segundo round por nocaute, de forma espetacular. Renato dormiu em sua antiga cama em êxtase depois de tanto tempo sem ver um bom evento de MMA e ser agraciado com essas duas brilhantes contendas.